A página de abertura já revela que a leitura da HQ Desconstruindo Una não será fácil.
Uma mulher sobe, claramente abatida e com sofridão, um morro, carregando um balão vazio — uma analogia ao diálogo que não existe. Lembra o mito de Sísifo, encarnado na mulher que tenta vencer preconceitos e fazer valer seus direitos eternamente, mas sempre é vencida por incompreensão, mais preconceito, machismo e violência. E tem que recomeçar a subida.
Una é uma artista cujo trabalho está voltado para o ativismo político, com atenção à violência contra mulheres.
Nesta HQ, lançada pela Nemo, ela reúne relato memorialístico, jornalismo e ficção em quadrinhos para ir a fundo na violência contra a mulher e em questões de gênero. Ela rememora sua infância na Inglaterra dos anos 70, conservadora e machista, de forma aberta. A violência que sofreu emerge das páginas sem carregar na emoção, mas de uma forma que puxa a reflexão.
Ela debate culpa, vergonha, responsabilidade e como o comportamento machista acaba por influenciar a vida de uma mulher pelo resto de sua vida. Ela recria situações talvez vividas por ela, mas certamente por milhões de mulheres em todo o mundo.
Ao expor casos reais de violência e em como as investigações ajudaram a perpetuar a ideia de que a mulher é culpada, Una dá voz e forma a um grito quase universal. Como ela escreve no posfácio, “culpar a vítima é um ato de refúgio e uma forma de nos enganar”.
“Desconstruindo Una” é uma das HQs mais potentes e um dos relatos mais vigorosos sobre o tema, fundamental nestes tempos em que a intolerância e a violência estão tomando fôlego. Com imagens e metáforas que não poupam o leitor, Una entrega uma obra necessária.
3 comentários em “Desconstruindo Una: a violência contra a mulher em sua forma mais bruta e verdadeira”