Impossível ler “A Redoma de Vidro” (Biblioteca Azul) e não imaginar que Esther Greenwood é sua criadora, Sylvia Plath. Talvez tenha sido – a história é inspirada na tentativa de suicídio da autora em 1952. Não importa. O único romance da poeta é daquelas obras que perturbam, independentemente das referências.
Relançado com nova tradução, de Chico Mattoso, o livro faz parte de um pacote de títulos de Sylvia Plath que a Biblioteca Azul coloca no mercado desde o ano passado. Além de “Redoma de Vidro”, já saiu “Desenhos”, coleção de ilustrações da poeta. Está previsto para este ano a coletânea de seus poemas, talvez a obra mais esperada. Espera-se também uma nova edição de seus diários.
O romance chega sem extras. Nem prefácio, posfácio, fortuna crítica, perfil, nada (fico a imaginar o que uma Cosac Naify faria com um título como este). Quem sabe no livro de poesias a editora resolva investir nesses caprichos.
De qualquer forma, é um lançamento a se louvar – a última edição do livro é de 1999, da Record, já esgotada. “A Redoma de Vidro” foi publicada em 1963, sob o pseudônimo de Victoria Lucas – Sylvia Plath queria poupar pessoas que poderiam se ver no romance.

A história de Esther
Esther, criada no subúrbio de Boston, encontra em Nova York uma oportunidade profissional de estudar em uma universidade e estagiar numa revista feminina. Para uma garota criada sem grandes perspectivas, a diversidade cultural da cidade a encanta ao mesmo tempo que perturba.
Prometida para casar com um jovem que também experimenta ascensão profissional, mas que está aquém da sua capacidade intelectual, ela vive o dilema de escolher entre ser independente e realizada profissionalmente ou ceder às amarras do casamento da época – mãe, dona de casa e impedida de trabalhar.
O que poderia ser um conflito natural para as mulheres da época se transforma no gatilho que levará Esther a uma clínica psiquiátrica. Sylvia Plath oferece a visão da sua personagem, narradora do romance. Ela nos conduz aos meandros da sua depressão, uma doença incompreendida ainda hoje – e que ira acometer a escritora até levá-la ao suicídio.
Lemos Esther, mas queremos ler Sylvia. E o que sai de “A Redoma de Vidro” é uma espécie de tentativa de respiro. Mas, um mês depois do lançamento, Sylvia Plath se matou.
*****
“Acontece que eu não estava conduzindo nada, nem a mim mesma. Eu só pulava do meu hotel para o trabalho e para as festas, e das festas para o hotel e então de volta ao trabalho, como um bonde entorpecido. Imagino que eu deveria estar entusiasmada como a maioria das outras garotas, mas eu não conseguia me comover com nada. (Me sentia muito calma e muito vazia, do jeito que o olho de um tornado deve se sentir, movendo-se pacatamente em meio ao turbilhão que o rodeia.)”
“Estava completamente escuro.
Eu sentia a escuridão, nada mais. Minha cabeça se ergueu, sondando o ambiente como a cabeça de uma larva. Alguém estava gemendo. Então um enorme peso chocou-se como uma pedra contra a minha bochecha, e o gemido foi interrompido.
O silêncio voltou, como água parada se recompondo depois de uma pedra a ter atingido.
Um vento frio me acertou. Eu estava sendo transportada velozmente por um túnel para o centro da terra. O frio parou. Houve um murmúrio, como se muitas vozes discordassem e reclamassem à distância. Então, as vozes se calaram.”
*****
Sinapse
- Um comentário sobre os “Diários” de Sylvia Plath, aqui no blog
- Uma entrevista com Peter K. Steinberg, biógrafo da poeta (em inglês)
Li esse livro há muitos anos, numa edição portuguesa, com o título A Câmpanula de Vidro. É muito duro, sem qualquer autocomplacência. E não há como dissociar a personagem da autora. Plath tem poemas lindos, o meu preferido é Olmo, que tem os versos: “Sou habitada por um grito /
Noite após noite bate asas / Procurando com as garras algo para amar”. Tenho um livro de poemas dela que comprei em SP, naquela livraria que tinha lá no Bixiga (acho que Pau-Brasil), nos tempos da faculdade.
CurtirCurtir
Lembro dessa livraria, ficava em frente ao Centro Cultural. Estou esperando sair a coletânea nova da poeta para comprar.
CurtirCurtir
Humn, acho que me enganei. Tinha uma livraria em frente ao Centro Cultural, mas lembrei de outra, na 13 de Maio, essa a que você se refere.
CurtirCurtir
Isso, ficava na 13 de Maio, ao lado do cineclube e pertinho do Café Piu-Piu. Pena que o Bixiga não é mais o mesmo. Adorava aquele lugar.
CurtirCurtido por 1 pessoa