O início é idílico. Dois homens estão arando seus campos e se encontram no alto do terreno que separa as suas propriedades, debaixo de uma árvore, para descansar e almoçar. Seus filhos, uma menino de 5 anos e um garoto de 7, levam a refeição.
A conversa se fixa no terreno que divide os dois campos. Sem dono, a comunidade espera que um dos dois compre. Eles recusam o negócio na conversa.
É o último momento de paz dos camponeses. Um deles resolve comprar o terreno, enquanto o outro avança suas fronteiras aos poucos. Tal como na obra de Shakespeare, as famílias se tornam inimigas. No caso do romance do suíço Gottfried Keller, a história que gerou “Romeu e Julieta na Aldeia” (Editora 34) teve como inspiração um caso real.
Anos depois, as duas crianças, já adultas, se encontram e se apaixonam. Em segredo, começam um namoro que parece impossível de se tornar vivo. As duas famílias, miseráveis depois de tempos de disputa e hostilidade, vivem distantes. O encontro é improvável, mas Keller transforma as adversidades em uma sequência de sonhos que emocionam.
Keller desenvolve sua história com elegância e uma prosa simples, bem construída e armada. A relação dos dois amantes é pueril, mas tão encharcada de realidade que fica impossível não se envolver no destino de ambos.
O livro é sublime. Foi indicação de um vendedor da livraria Quixote, de Belo Horizonte. É desses lugares em que é possível olhar os livros, conversar, sentar para folhear sem pressa e sem tumulto.
A edição da 34 traz ilustrações de Karl Walser, que funcionam como um sensível complemento ao romance, e um texto do escritor Robert Walser.
Para completar, a tradução de Marcos Vinicius Mazzari conforta o leitor não só com o bom trabalho. Suas notas de rodapé transformam o romance num passeio pela história da Suíça, suas tradições e origens. Sem exagero, são precisas e nos lugares certos. Como se fossem um segundo livro, essas notas enriquecem e deixam o romance com um gosto superior.